E tem mais...

(...)

Um monte de coisa misturada..

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Mais um conto que eu escrevi

Esse tinha como tema algum dos 10 mandamentos, ou mais...eis o que me veio, esse sem título:

Ana Marie esquiava no ladrilho há 12 cm do chão. Tinha marido, empregada, um Closet, e um pequeno dog alemão. No rastro do perfume caro andava Cleunice, um sorriso de pessoa. Ana Marie pedia, gritava, Cleunice obedecia. O expediente era-lhes divertido da mesma forma. Ambas observavam as esquisitices do tratar-se, do conviver e do mal dizer. Por vezes Cleonice ouvia as reclamações de Ana Marie daquelazinha do departamento jurídico, daquela outra do RH, e sentia-se parte, como umazinha querida por ouvir, pois se ouve, não se lhe é falado. Toc toc toc, Ana Marie vem em cima dos seus centimetros, e não pelo barulho, muito pelo jeito que vem, é reconhecida. Mulherão! Isso que é exemplo, bem feita, chique, elegante, toda posuda. Cleonice expirava enfim voltando para os seus. Shish shish shish, a rasteira marrom de guerra ia pelo paralelepípedo do bairro. Mamãe chegou! Desodorante vencido, criançada pro banho, ela levanta as pernas. Música ao fundo, um tom acima do audível, buzinas ao longe não chegam a atrapalhar.
Ela segue sempre primeiro ao lavabo, extirpa a sujeita dos outros, da rua. Vinho tinto? Prefiro o branco, tenho dor de cabeça. Massagem senhora? Deixe-me só. Calma!Espere! Ele ligou?Vem?Ok, obrigada, boa noite. Ela toma seu chá de camomila, e lê o romance do último pocket book que comprou na banca. Gostou de aprender mais do inglês, um livro pro bolso, que não cabe no bolso. Ela riu. Bem prática essa idéia, quem teve deve bem estar rico. Rica. Ela usa a máscara azul toda quarta. Era sexta. Uma gota azul cai no boudoir de seda bege. Ela o tira e olha-se no espelho. Ri. Chora.
Novo dia, segunda-feira. Ana Marie passa como quem não vê. Burburinho geral, ela tem em uma das pernas a meia rasgada. Risos, o dia começa bem para o resto. Cleonice não vê graça. Dona Ana, Seu Antônio te ligou, sobre aquele orçamento. A senhora chora? As persianas descem, as duas desiguais estão juntas e longe daquelezinhos. Cleonice, você é feliz? Sou sim. Tem umas horas que eu fico sim, com o coração apertadinho, aquela preocupação que a gente tem, mais quando é mãe. Então, se você não tivesse filhos você não teria nenhum aperto? Dona Ana Marie, eles são minha vida, eu não sei te dizer se ele são o porquê de eu ser feliz ou infeliz, eu acho que cada um tem a sua vida e tenta fazer dar certo, não é? É sim querida. Obrigada. Retorne a ligação pro Antônio, por favor. Sim senhora.
Cleonice sentia-se estranha, como se alguém olhasse a vida dela. Dona Ana Marie continuou a semana como sempre, era quinta e parecia que não havia chorado na segunda. O que será que faz alguém como ela sofrer? Será mais difícil ser feliz quando é rico, será que a felicidade é mais sofisticada? Sorriu de seu pensamento, aqueles livros a faziam pensar coisas que não imaginava. Domingo. Cleonice católica fervorosa preparava-se para a missa. Celular tocando. Quem seria em um domingo? Dona Ana Marie. Cleonice, preciso de você agora no escritório. Sim senhora, daqui uma hora estarei lá. Ela beijou as crianças que comemoraram por não ter que ouvir o sermão do padre naquela semana. Cleonice sentou no escritório, atendeu uma ligação e voltou pra casa.