E tem mais...

(...)

Um monte de coisa misturada..

sábado, 12 de agosto de 2017

O corpo

Olá velho amigo,


É hora de conversarmos melhor sobre tudo que vivemos nos últimos 32 anos. Gostaria muito de começar essa conversa assumindo como sou hipócrita. É verdade sim que há certo tempo passo meus dias discursando sobre como é urgente a busca pela sensação de gratidão pelos corpos que carregamos. Sei também que assumo diariamente a quem possa perguntar, como é menos importante a aparência da pele em dias menos ensolarados. Sobretudo, compreendo que venho tentado com muito esforço atribuir maior importância ao cérebro ao invés de nos preocuparmos tanto com nossa aparência. Nossos braços, coxas, bunda, e claro, a malfadada barriga que insiste em se manter protuberante, nem mesmo em uma simétrica forma redonda, mas algo como uma geléia mal construída que pende para os lados. Sim, já comecei a destilar tudo que sinto ao olhar para o espelho. Você corpo, vê através dos olhos que carregamos o asco que não consigo fingir, mesmo dispondo dos mais variados conselhos que julgo possíveis às outras mulheres quando insisto para que se enxerguem belas. Ah corpo, como é fácil dizer. Como é difícil sentir o que o cérebro entende apesar de todo o estudo, todo o afeto que vem dos outros. Eu olho para você, e por consequência eu olho para mim mesma, e enxergo nada além de uma massa meio disforme, que lembro saudosa que um dia teve forma, mas que curiosamente, também naquela época eu não aceitava. Todo você corpo, parece sustentar-se em torno da barriga, até mesmo meus seios antes tão amados agora caem em cima dela. Sempre ela. E é para ela que vão todas as dores e preocupações, fora o desgosto de sua imagem, ainda deposito na barriga as ansiedades da vida. Se sou realmente boa no trabalho, oscilo entre achar que sim e que não, e nessa oscilação me percebo antecipando o momento em que entendo que não sou na verdade, boa. Suficiente. Por isso me sinto crescer, expandir, não de uma maneira boa. Me sinto exagerada e mesmo assim insuficiente. Ainda assim há dias bons, em que te agradeço por estar pleno e forte, que te levo para passeios inesquecíveis, que sinto meu amor te tocar à despeito da vergonha que ele parece estranhamente não sentir. Me pergunto se o que vejo no espelho é o que ele também vê. Ou aquilo que alguém enxerga quando me sugere outro vestido, algo que caia melhor em você, corpo. Serão as roupas nossas maiores rivais, ou será que somos seus reféns eternos à mercê da vontade que elas têm de nos mostrar, ora como somos, ora como podemos ser, como se contraditoriamente fizessem boa e má publicidade?

Aufwiedersehen!