E tem mais...

(...)

Um monte de coisa misturada..

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Inércia

Com coragem olhou para o relógio. 11:48h. A TV ainda participava da trilha matinal, enquanto os olhos nem fechados nem despertos insistiam não tomar decisão alguma. O estômago roncou. Um emaranhado de fios e poeira alçava vôo do chão da sala. Chega. Ela colocava com força desnecessariamente enfática os móveis em cima dos sofás. Cadeiras eram jogadas com cuidado abrupto sobre a mesa. Vassoura, tosse, pano, e o cheiro reconfortante da hortelã brigava com o barulho dos ônibus incansáveis do lado de fora. As roupas sentiam-se amassadas. Ferro, fogo, dobras. Do quarto pessoas conversavam aleatoriamente na sala. A TV era posta pra dormir. Era ela agora que precisava ser arrumada. O interruptor do chuveiro dizia inverno, e ele estava certo, mas ela precisava do frio escorrendo, mudou contra a vontade para a função verão. Arrepios desagradáveis, os olhos decidiam-se, queriam despertar. Já provida de sua toalha nova, que por isso não sabia direito enxugar, pensou naquele vestido. Sua mãe o havia comprado para um casamento, ele tinha essa estampa geométrica, que ela achou levemente informal para tal cerimônia. O vestido era bonito, e com ele tentou sair para a rua num dia qualquer, só que ele aparecia-se muito formal para o dia a dia. Talvez ele servisse para um dia como aquele. Vestiu-o e do espelho não conseguia decidir quem era e se servia àquele lugar barulhento. Uma sirene qualquer passou rapidamente pela rua, ela sentiu que respirava, respirou fundo para conferir e saiu.

Aufwiedersehen!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

09 de janeiro em outro lugar

O viajante na maior parte de sua vida precisa trabalhar, e por isso acaba por perder a perspectiva do momento e por consequência a esquecer-se de onde está. Aí, em dado momento, ele retorna para o “no man's land” e começa a pensar o que quer da vida, mas o movimento o atrapalha como aquele vento que sacode o cabelo no rosto. Ele não é mais João, Pedro, Maria, de repente ele é brasilero. O viajante é sobretudo um malagradecido. Assim mesmo, tudo junto como dizem nossos avós MALA-GRA-DE-CIDO!Gosto de dizer que sou um desses, uma aventureira, que sinto claustrofobia, aracnofobia, cleptomania, ou seja lá o que for em lugares fechados, que me repugna a rotina. Tudo falácia! O malagradecido é antes de tudo um sujeito esquecido. Esquece que tem saúde, boa família, um teto. Que ele faz? Procura sarna pra se coçar! Estou na capital da Argentina, sentada na colorida sala de um prédio pintado em vermelho queimado, onde a luz entra sem pedir licença e aqui permanece até às 21h, veja lá que audácia! Daqui de minha cadeira, abóbadas de prédios antigos multicolores, todos têm um grande alfinete que aponta para o infinito sobre nossas cabeças. Conheci uma duzia de pessoas ou mais de todo lugar, conversei no meu inglês da adolescência, e até ensaiei alguns discursos no espanhol vizinho com aquele x ordinário argentino que vai no lugar do r, e que eu insisto em não aprender, por que parece que eles insistem em escrever o meu português errado! Sinto-me feliz por que viajo, percebo a saudade da intimidade muitas vezes incoveniente do cotidiano, das ligações de madrugada, das responsabilidades enfim...Dou um gole na minha Quilmes e preparo-me para mais uma noite de sofrimento em Buenos Aires, para tentar ser menos malagradecida.

Aufwiedersehen!!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Um último suspiro do passado

2010. O que me aconteceu nesse ano? Nada praticamente. Na realidade, tudo. Final de ano se parece muitas vezes com uma soma de “mal agradecimentos”, pelo menos no meu caso. Existe ainda a comparação. Em 2009, só nesses 12 meses, boa parte deles, oito, vivi em outro continente, em um país que já se parecia muito com uma casa, daquelas bem arrumadas, com pessoas sóbrias e diferentes de onde você vem, mas um lugar ainda menor dentro desse continente foi conquistado a muito custo. Onde foi parar esse ingrediente físico da adrenalina, da luta contemporânea pela sobrevivência? Por que a nossa vida vale a pena? Eu penso que é por que não existe marasmo, o nosso organismo pede mais, daí nossa insatisfação perene, que nunca sai, ta sempre lá coçando por dentro, fazendo com que pareça que a gente não valoriza o que temos. Não tem essa de consciência. Somos assim.
Em 2009 tudo era magistral, evento generalizado, um acontecimento. Eu não me dou muito com pequenas reuniões, eu quero fogos de artifício, como os que vi brigando pelo espetáculo da passagem do ano com a neve em 2008, no inverno do outro lado do oceano. Aquela intuição de que aquele ano de 2009 ia ser maravilhoso se comprovou. Eu era a heroína (pelo menos de mim mesma), que regressava de uma jornada pessoal vitoriosa. Eu realizava o sonho de voltar e abraçar minha família e amigos de sempre e eu podia abraçar o mundo. Naquele mês de agosto, quando completava 24 anos nada era impossível, tentar um lugar em uma área que não era a minha de formação profissional era um chute, que depois de um mês foi concretizado, eu tinha um emprego!Depois de três meses eu morava em um apartamento exatamente como eu imaginava, com duas amigas amadas. Eu começava a minha vida.
2010. A passagem de ano dessa vez olhando o mar, sentindo a chuva e o calor, foi diferente. Eu sentia a tal da adrenalina se esvair aos poucos. Estabilidade. Essa é a palavra desse ano. Recolhi-me, trabalhei, estudei Cinema, estudei Literatura, voltei pra natação, inércia. Todo movimento tende a continuar o que começou sem mudar de direção, ou algo do tipo. Estabilidade que leva ao acomodamento, que leva ao conformismo, preguiça, conforto. Eu amadureci. Tem coisa mais chata que isso?

Aufwiedersehen!!