E tem mais...

(...)

Um monte de coisa misturada..

terça-feira, 24 de junho de 2014

Dos perigos de estar presente


Sabe os acontecimentos cotidianos da vida adulta?Um fornecedor que não cumpre prazo, um e-mail carregado de má educação, um encontro planejado a semanas que acaba não rolando, coisas, diárias. Eu sofro por elas, esse é o meu modo de conviver com o mundo. Dizem que a comédia é o lado avesso da tragédia, e vice e versa, entre os dois, eu sempre recaio para o drama, não aquele mexicano, cheio de lágrimas e fel, um drama mais nuclear, composto por pequenas implosões seqüenciais, melhor denominadas como gastrite nervosa. 

Não foi sempre desse jeito, quer fizer, meu caráter sempre foi claro, eu crio expectativas em série, eu espero muito, costumo até brincar que isso é um tipo crônico de otimismo burro, o que nunca funciona, e paw!Quando menos se espera, a iminente queda e o correr tresloucado atrás do prejuízo. Eu tentei fugir desse meu aspecto, pagando entrada em um ciclo contínuo de apatia (vide post anterior), um tipo de mecanismo de distanciamento programado, dessa forma você sofre menos sim. Comprovadamente. Não preciso completar, entretanto, e não sem água nos olhos, que dessa forma você também não sente as alegrias insensatas do vulnerável. Do estar presente. A minha vida (como a vida da maioria dos seres humanos que chegam na idade adulta), ficou séria de repente, é tudo ao vivo, pá pum!Mas eu jamais seria capaz de voltar integralmente ao que eu era antes, eu estou acordada demais para isso.

Aufwiedersehen!

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Sobre a apatia

"Eu trabalho com comunicação". Toda vez que digo isso, sinto-me como que contando uma piada. Minha interlocutora, uma senhora no ônibus, brilhava seus olhos alegres por trás de suas bifocais, dava pra ver que ela ansiava por uma conversa profunda, ou até mesmo um bate papo casual com aquela jovem "comunicadora", que a respondia monossilábica e sem ânimo.

Eu estava sentada na parte da frente do ônibus, prestes a mergulhar no meu estado ensimesmado, uma prática de anos, desde que descobri as metrópoles, um estado de total contemplação, que guarda lugar cativo nos ônibus. Eu adoro ver a paisagem passar lá fora, e a ideia de que eu vou chegar no meu destino apenas estando sentada. Eu moro em São Paulo, mas a minha experiência é uma exceção, por que eu não tenho horários tradicionais de expediente como o resto das pessoas de bem, e também por que eu moro na arborizada zona oeste, e no máximo me movimento até a vila mariana. Enfim, essa senhora, tentava com muita dificuldade, e ainda segurando uma bengala, subir no ônibus pela escada, quando eu fiz menção de me levantar para ajudá-la, mas o próprio motorista se adiantou e o fez. Foi apenas uma pausa no meu estado vegetativo contemplativo, mas esse pequeno gesto mecânico acendeu uma simpatia instantânea nela, que sentou no banco à minha frente.
Eu olhava pra fora, quando ela me chamou, e agradeceu pela tentativa de ajudá-la, e então iniciou, ou pelo menos tentou, iniciar o diálogo acima.

Depois de algumas tentativas mal sucedidas contra a minha apatia deliberada, a senhora virou-se de volta para o seu lugar, vencida, deixando-me menos como uma vitoriosa e mais como alguém digna de pena. Eu lembrei da vó que eu perdi no ano passado mais ou menos com a mesma idade da senhora que falava comigo. Eu pensei em como eu gostaria de bater um papo furado que fosse com ela naquela momento. Senti o tradicional líquido imaginário fervente descendo pela minha garganta até a boca do estômago, um companheiro dos dias de stress, que descia nesse momento carregado de desaprovação.

Lembrei dos quadros do Edward Hopper, que eu tanto admiro, e das suas ilustrações de pessoas sozinhas em lugares públicos, apáticas e patéticas, mesmo que pintadas sob as luzes mais lisonjeiras.


Ao me aproximar do meu ponto, levantei-me e meio que esperançosa para me redimir, sacudi um até logo para a senhora, que agora me respondia à altura, com um ausente: até.

Aufwiedersehen...

quarta-feira, 11 de junho de 2014

A fabulosa história da garota que nunca namorou

Sabe aquele relacionamento tradicional, o teste antes do casamento, aquele convívio próximo e monogâmico para entender se aquela pessoa é a indicada para entregarmos a nossa vida e criar uma família? Eu nunca tive isso.

O namoro sempre foi um tabu pra mim, e como todo tabu, algo muito distante que acabou tomando uma proporção maior do que a real de importância. Como solteira meio convicta, eu acabava escutando coisas do tipo: “Você está escolhendo muito”, “Você não deve estar prestando atenção direito”, “Mas você é tão bonita”, ou o meu preferido “Não fale ou faça isso ou aquilo, assim você assusta os homens”. Eu costumava acalmar a todos contando que tinha tal carinha...e sempre teve, mas né? Eu costumava utilizar boa parte do meu tempo e energia para organizar e gerir esses carinhas, alguns deles duravam anos entre idas e vindas em um acordo não dito de "liberdade", com os envolvidos "conscientes" da decisão. 

Depois de um tempo, comecei a comprar a idéia da necessidade do namoro e a pensar que tinha alguma coisa muito errada comigo, e então, quase prestes a me auto-diagnosticar como algum tipo de retardada sentimental resolvi procurar a psicanálise.

Eu tinha 25 anos e uma sensação de não pertencimento, afinal, todos namoravam, era a coisa mais comum do mundo, tinha amigas que já tinham namorado sério e por anos, e costumava pensar que "eu simplesmente não era capaz de conseguir isso por algum problema psicológico".

O que a analise fez foi indagar: "Ok, você nunca namorou, mas por que isso te incomoda tanto?", e então, quem já fez análise sabe a caixa de Pandora que se abre na sequência, e a questão do namoro passou a ser algo irrelevante dentro das minhas construções psicológicas e de como eu enxergava a vida. Engraçado como a análise te grita na orelha o quanto não somos especiais, mas ao mesmo tempo o quanto é importante saber que somos seres particulares, e que não faz sentido algum essa comparação externa em relação a outros seres particulares. Resumindo: você não é especial, mas você é você.

Hoje, depois de mais de três anos de frustração, angústia, apatia, alívio e felicidade (exatamente nessa ordem), eu sei que eu nunca namorei simplesmente por que eu não quis. Eu quis viver a vida que eu tinha escolhido, total liberdade de escolha, de ir e vir - não que não existam relacionamentos maravilhosos que permitam tudo isso, eu só não queria ter que me preocupar com outra pessoa além de mim mesma. E sim, o egoísmo pode ser algo positivo, por que a culpa, essa coisa totalmente sem serventia, a análise me tirou. 

Apesar de entender na análise que eu queria ficar sozinha, eu também consegui reconhecer uma dificuldade, talvez mesmo por falta de hábito, de me abrir para as pessoas, de guardar minhas frustrações para mim mesma - essa atividade tem um nome científico: recalque, que é um mecanismo do nosso inconsciente usado para guardar sensações que não elaboramos, deixando pra depois. Um tipo de bola de neve psicológica que mais tarde volta de diversas maneiras, doenças, alergia, depressão, e por aí vai.

Hoje, depois de me dar uma “auto-alta” da análise, entendi que além de Freud, posso contar com a minha família e amigos para colocar toda a sujeira pra fora, e que eu teria que fazer um exercício para voltar a me deixar vulnerável, por que eu finalmente queria me envolver com alguém. Por escolha, não por pressão externa.


Aí inventaram o tal do tinder. Pesquei esse nome pela primeira vez em uma conversa entre amigas, uma delas começou a me explicar que seria um aplicativo para pessoas solteiras encontrarem seu par romântico. Outra amiga contestou dizendo que o tinder era a versão heterossexual do grinder, este usado e praticado com ênfase pelo seu amigo gay, e ela concluía: "o tinder não é um aplicativo de paqueras, as pessoas o acessam só pelo sexo!" Eu parei, refleti, e respondi como que me indagando em voz alta: "existe paquera sem fins sexuais?" Silêncio. 

Aquela indagação me fez pensar e da decorrência dela eu senti um certo alívio, chacoalhei minha educação empoeirada e machista, coisa difícil de se fazer depois de anos, e concordei comigo mesma: nós procuramos sexo no pares amorosos. Engraçado como normalmente separamos um do outro, como se a mulher, a esposa, a namorada, tivesse que ser essa pessoa assexuada, a mãe dos seus filhos. 
A premissa de que a procura pelo sexo subtrai o interesse amoroso é furada. O amor, no mundo real, de adultos, e não aquela ideia do conto de fadas, dos vampiros do Crepúsculo e da Malhação, não vem depois do casamento, ou em menor grau, da paixão avassaladora, ele vem mesmo da combinação de interesses complementados com a atração física que fecham o ciclo do companheirismo. Algo muitas vezes banal e cotidiano, com pequenas asas de borboletas batendo no estômago (own...)
E então, pra fechar o assunto, eu cheguei em um ponto em que eu não vi mais sentido em “ficadas”, e “rolos” casuais, simplesmente parei, até brinquei que eu tinha perdido meus poderes. Eu queria um relacionamento, uma parceria, queria dividir a minha vida com alguém, e o que antes era um passatempo interessante começou a gritar alto como perda de tempo. Foi aí que eu vi no tinder uma oportunidade de me colocar a disposição, mas não somente isso, na virada de páginas de homens e consequentemente, na minha imagem estampada no aplicativo, eu mandava uma mensagem geral, e principalmente para mim mesma de que eu finalmente estava disponível, algo muito maior que estar apenas solteira. 
Eu nunca encontrei (fisicamente), com ninguém que eu conheci no tinder - estou inativa no aplicativo até o fechamento desse post - e no momento prefiro jogar a minha pequena sorte no offline ar de todo dia.


Aufwiedersehen!!